Quando você olha pra algo muito diferente, sua cabeça leva
um pequeno choque e tenta pegar aquela coisa tão incomum e organizá-la junto das coisas que você já conhece,ou pelo menos da coisa
mais parecida possível. Com o tempo, aquilo que era esquisito acaba achando seu lugar, até que apareça a próxima coisa
esquisita. Com todo mundo é assim. Inclusive com Tiago.
Tiago tinha cerca de 12 anos, não gostava de usar calças
compridas, gostava de bolas de gude e no lugar onde deveria estar sua cabeça
havia um balão. Isso, uma bexiga. Amarela ainda por cima. Como pra
toda criança, a vida de Tiago não tinha sido fácil até ali. As pessoas o recebiam
com certa rejeição, contudo depois se acostumavam com aquela
bola amarela, oscilando com as pequenas brisas. Para Tiago era mais esquisito ainda, pois não era parecido com ninguém da família mas
mesmo assim, ele não sentia-se triste ou algo parecido. Sentia apenas que não
era igual.
Ele não falava, claro, mas era inteligentíssimo. Na escola,
sofria perseguição dos seus colegas que corriam atrás dele com pregos e objetos
pontudos para assustá-lo. Ele ficava morrendo de medo, mas sabe como
é criança, acabava deixando para lá. Ele mesmo aprendeu a se defender, quando
um dia para assustar a todos, desenhou um rosto de ponta à cabeça
na própria cabeça, ou seja, na bexiga. Quão grande foi o susto quando começou a
correr atrás dos seus colegas no pátio e todos os que metiam medo nele,
agora corriam de pavor diante daquela visão. Um deles até mijou nas calças. Isso rendeu uma baita
reclamação na diretoria mas quem podia culpá-lo? Até a diretora falava
com ele com certo medo. Mandou ele lavar o rosto e apagar aquilo da...han...da cara.
Tiago também gostava muito de mágicas. Seu ídolo era o
grande mágico Houdini. Foi numa Feira de Ciências da escola onde fez sua grande
mágica. Dias antes, se mostrava muito empolgado com toda aquela história.
Tinha desenhado cartazes da sua apresentação na tal Feira, ficava trancado
horas no quarto, lendo e relendo livros sobre grandes proezas
mágicas.
Chegado o dia da Feira de Ciências, todos os alunos exibiam
seus projetos com orgulho e Tiago, metodicamente em cima de um grande caixote,
esperava às 16 horas, hora da sua apresentação e quando ela enfim
chegou, não decepcionou ninguém. Os outros projetos já tinham encerrado e
Tiago, com uma capa maior que ele, que arrastava no chão, fazia sinal chamando
as pessoas mas também pedindo espaço.
Se curvou, agradeceu à todos e com um
movimento rápido das mãos, fez confetes voarem. Todos aplaudiram. Em
seguida preparou-se para aquilo que levara dias lendo e estudando sobre. Pegou
um caixote menor do que aquele que já estava em cima, subiu,
abriu os braços e teatralmente jogando a capa para trás, deu um grande pulo em
direção ao seu público, que recuou assustado.
Porém nada chegou no público senão uma camiseta, uma capa,
uma bermuda e um par de sapatos. Quando deram por si, um balão amarelo subia no
céu, indo pra um lado e pro outro, levado pelo vento até
sumir diante do silêncio da platéia boquiaberta. E quem sabe onde esse menino
foi parar?
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